terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O casamento como esconderijo


Ao desfrutar de uma almoço afetuoso com um novo amigo querido, ele me disse que precisava me enviar uma crônica da Martha Medeiros que tinha tudo a ver comigo.

Então, lendo a tal crônica, cheguei à conclusão que Martha colocou em palavras o que eu penso, enquanto solteira. Fica aqui a contribuição dela, através do amigo querido, a todos nós!


"No livro Monogamia, do psicanalista Adam Philips, há um trecho em que ele diz que o esconderijo mais aconchegante é aquele em que conseguimos esquecer do que estamos nos escondendo.Mais: é aquele em que até esquecemos que estamos escondidos. E conclui: "formamos casais porque é impossível esconder-se sozinho".

O casamento como esconderijo. Eu nunca havia pensado nisso antes.

Uma pessoa avulsa é uma pessoa com sua solidão escancarada, é uma pessoa que necessita fazer contatos e explicar quem é, o que faz, do que gosta.Uma pessoa sozinha é visada, está exposta, julgam que ela tem mais tempo, está mais disponível, uma pessoa sozinha não tem onde esconder-se. Já duas pessoas juntas escondem-se das fantasias e do julgamento alheio, escondem-se de sua própria vulnerabilidade e dos seus próprios segredos, duas pessoas juntas protegem-se oficialmente, mesmo sem ter a consciência de que sua união também é isso, um esconderijo.

A sociedade costuma cobrar relações amorosas daqueles que escolheram viver sozinhos, ou estão sozinhos por contingência do destino. Os solitários, os ermitãos, os donos da própria vida são tratados como se estivessem à margem, mas são os casados os verdadeiros excluídos, porque, uma vez cumpridores de uma expectativa social, perdem seu potencial para surpreender, não chamam mais a atenção, passam a ser apenas fazedores de filhos e de dívidas, consumidores de imóveis de três dormitórios e carros utilitários, viram alvo apenas das corretoras de seguro e dos agentes de viagem.Dentro de um casamento, julga-se que há duas pessoas realizadas, completamente a salvo da angústia existencial, da carência afetiva, dos traumas de infância, da insanidade, do vício e dos ímpetos - imagine,ímpetos: casais jamais ousariam fazer algo sem pensar, sem conversar muitas vezes antes, durante e depois do jantar.

A solidão, que sempre pareceu nos proteger, na verdade nos coloca no centro das atenções, permite que coloquem o dedo nas nossas feridas. Já o casamento nos tira da prateleira, nos resguarda, nos esconde tão bem e tão sem alarde que a gente nem percebe que está escondido. Que ironia: o casamento é que é underground."

Um comentário:

  1. Ariane, eu também nunca tinha pensado nisso...
    Mas às vezes me sinto um "alien", solteiro e sem filhos a esta altura - com quase todos os amigos casados!

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